1. (Enem PPL 2015) O peru de Natal
O nosso primeiro Natal de
família, depois da morte de meu pai acontecida cinco meses antes, foi de
consequências decisivas para a felicidade familiar. Nós sempre fôramos
familiarmente felizes, nesse sentido muito abstrato da felicidade: gente
honesta, sem crimes, lar sem brigas internas nem graves dificuldades econômicas.
Mas, devido principalmente à natureza cinzenta de meu pai, ser desprovido de
qualquer lirismo, duma exemplaridade incapaz, acolchoado no medíocre, sempre
nos faltara aquele aproveitamento da vida, aquele gosto pelas felicidades
materiais, um vinho bom, uma estação de águas, aquisição de geladeira, coisas assim.
Meu pai fora de um bom errado, quase dramático, o puro-sangue dos
desmancha-prazeres.
ANDRADE, M. In: MORICONI, I. Os cem melhores contos brasileiros do século.
São Paulo: Objetiva, 2000 (fragmento).
No fragmento do conto de
Mário de Andrade, o tom confessional do narrador em primeira pessoa revela uma concepção
das relações humanas marcada por
a) distanciamento de estados
de espírito acentuado pelo papel das gerações.
b) relevância dos festejos
religiosos em família na sociedade moderna.
c) preocupação econômica em
uma sociedade urbana em crise.
d) consumo de bens materiais
por parte de jovens, adultos e idosos.
e) pesar e reação de luto
diante da morte de um familiar querido.
2. (Enem 2015) Em junho de 1913, embarquei
para a Europa a fim de me tratar num sanatório suíço. Escolhi o de Clavadel, perto
de Davos-Platz, porque a respeito dele me falara João Luso, que ali passara um
inverno com a senhora. Mais tarde vim a saber que antes de existir no lugar um sanatório,
lá estivera por algum tempo Antônio Nobre. “Ao cair das folhas”, um de seus
mais belos sonetos, talvez o meu predileto, está datado de “Clavadel, outubro, 1895”.
Fiquei na Suíça até outubro de 1914.
BANDEIRA, M. Poesia completa e
prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1985.
No relato de memórias do
autor, entre os recursos usados para organizar a sequência dos eventos
narrados, destaca-se a
a) construção de frases curtas
a fim de conferir dinamicidade ao texto.
b) presença de advérbios de
lugar para indicar a progressão dos fatos.
c) alternância de tempos do
pretérito para ordenar os acontecimentos.
d) inclusão de enunciados com
comentários e avaliações pessoais.
e) alusão a pessoas marcantes
na trajetória de vida do escritor.
3.
(Enem 2014) Camelôs
Abençoado seja o camelô dos brinquedos de
tostão:
O que vende balõezinhos de cor
O macaquinho que trepa no coqueiro
O cachorrinho que bate com o rabo
Os homenzinhos que jogam boxe
A perereca verde que de repente dá um pulo
que engraçado
E as canetinhas-tinteiro que jamais
escreverão coisa alguma.
Alegria das calçadas
Uns falam pelos cotovelos:
— “O cavalheiro chega em casa e diz: Meu
filho, vai buscar um pedaço de banana para eu [acender o charuto.
Naturalmente o menino pensará: Papai está
malu...”
Outros, coitados, têm a língua atada.
Todos porém sabem mexer nos cordéis como o
tino ingênuo de demiurgos de inutilidades.
E ensinam no tumulto das ruas os mitos
heroicos da meninice...
E dão aos homens que passam preocupados ou
tristes uma lição de infância.
BANDEIRA, M. Estrela da vida
inteira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2007.
Uma das
diretrizes do Modernismo foi a percepção de elementos do cotidiano como matéria
de inspiração poética. O poema de Manuel Bandeira exemplifica essa tendência e
alcança expressividade porque
a) realiza
um inventário dos elementos lúdicos tradicionais da criança brasileira.
b) promove
uma reflexão sobre a realidade de pobreza dos centros urbanos.
c) traduz
em linguagem lírica o mosaico de elementos de significação corriqueira.
d) introduz
a interlocução como mecanismo de construção de uma poética nova.
e) constata
a condição melancólica dos homens distantes da simplicidade infantil.
LITERATURA- MODERNISMO- 1ª GERAÇÃO
4. (Enem PPL 2015) Vei, a Sol
Ora o pássaro careceu de
fazer necessidade, fez e o herói ficou escorrendo sujeira de urubu. Já era de
madrugadinha e o tempo estava inteiramente frio. Macunaíma acordou tremendo,
todo lambuzado. Assim mesmo examinou bem a pedra mirim da ilhota para vê si não
havia alguma cova com dinheiro enterrado. Não havia não. Nem a correntinha
encantada de prata que indica pro escolhido, tesouro de holandês. Havia só as formigas
jaquitaguas ruivinhas.
Então passou Caiuanogue, a
estrela da manhã. Macunaíma já meio enjoado de tanto viver pediu pra ela que o
carregasse pro céu.
Caiuanogue foi se chegando
porém o herói fedia muito.
– Vá tomar banho! – ela
fez. E foi-se embora.
Assim nasceu a expressão
“Vá tomar banho” que os brasileiros empregam se referindo a certos imigrantes
europeus.
ANDRADE, M. Macunaíma: o herói sem nenhum
caráter. Rio de Janeiro: Agir, 2008.
O fragmento de texto faz
parte do capítulo VII, intitulado “Vei, a Sol”, do livro Macunaíma, de
Mário de Andrade, pertencente à primeira fase do Modernismo brasileiro. Considerando
a linguagem empregada pelo narrador, é possível identificar
a) resquícios do discurso
naturalista usado pelos escritores do século XIX.
b) ausência de linearidade no
tratamento do tempo, recurso comum ao texto narrativo da primeira fase modernista.
c) referência à fauna como
meio de denunciar o primitivismo e o atraso de algumas regiões do país.
d) descrição preconceituosa
dos tipos populares brasileiros, representados por Macunaíma e Caiuanogue.
e) uso da linguagem coloquial
e de temáticas do lendário brasileiro como meio de valorização da cultura
popular nacional.
5. (Ufu 2015) O último poema
Manuel Bandeira
Assim eu queria o meu último poema
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume
A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos
A paixão dos suicidas que se matam sem explicação.
BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e
prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1996, p. 223.
De acordo com o poema acima, assinale a alternativa correta.
a) Neste poema de
versos regulares, o eu lírico emprega o metadiscurso, debruçando-se sobre seu
próprio fazer poético.
b) Neste poema de
versos livres, o eu poético lança mão da metalinguagem para refletir sobre o
seu próprio processo criativo.
c) Neste poema de
versos brancos, o eu lírico, pelo processo metalinguístico, compara a poesia ao
suicídio.
d) Neste poema de
versos rimados, o eu lírico, pelo processo da metapoesia, compara o fazer
poético ao diamante.
6. (Enem PPL 2015) TEXTO I
Versos de amor
A um poeta erótico
Oposto ideal ao meu ideal
conservas.
Diverso é, pois, o ponto
outro de vista
Consoante o qual, observo o
amor, do egoísta
Modo de ver, consoante o
qual, o observas.
Porque o amor, tal como eu
o estou amando,
É Espírito, é éter, é
substância fluida,
É assim como o ar que a
gente pega e cuida,
Cuida, entretanto, não o
estar pegando!
É a transubstanciação de
instintos rudes,
Imponderabilíssima, e
impalpável,
Que anda acima da carne
miserável
Como anda a garça acima dos
açudes!
ANJOS, A. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1996 (fragmento).
TEXTO II
Arte de amar
Se queres sentir a
felicidade de amar, esquece a tua alma.
A alma é que estraga o
amor.
Só em Deus ela pode
encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus – ou fora do
mundo.
As almas são
incomunicáveis.
Deixa o teu corpo
entender-se com outro corpo.
Porque os corpos se
entendem, mas as almas não.
BANDEIRA, M. Estrela da vida inteira. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1993.
Os Textos I e II apresentam
diferentes pontos de vista sobre o tema amor. Apesar disso, ambos definem esse sentimento
a partir da oposição entre
a) satisfação e insatisfação.
b) egoísmo e generosidade.
c) felicidade e sofrimento.
d) corpo e espírito.
e) ideal e real.
7.
(Unesp 2015) Em 1924, uma caravana
formada por Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral e o poeta
franco-suíço Blaise Cendrars, entre outros, percorreu as cidades históricas
mineiras e acabou entrando para os anais do Modernismo.
O movimento deflagrado em 1922 estava se
reconfigurando.
MARQUES, Ivan.
“Trem da modernidade”. Revista de História da Biblioteca Nacional,
fevereiro de 2012. Adaptado.
Entre as características da “reconfiguração”
do Modernismo, citada no texto, podemos incluir
a) a politização do movimento,
o resgate de princípios estéticos do parnasianismo e o indigenismo.
b) a retomada da tradição
simbolista, a defesa da internacionalização da arte brasileira e a valorização
das tradições orais.
c) a incorporação da estética
surrealista, o apoio ao movimento tenentista e a defesa do verso livre.
d) a defesa do socialismo, a
crítica ao barroco brasileiro e a revalorização do mundo rural.
e) a maior nacionalização do
movimento, o declínio da influência futurista e o aumento da preocupação
primitivista.
Gabarito:
Resposta da questão 1:
[A]
[A]
O último
período do excerto é revelador do confronto entre o narrador e seu pai, cuja
morte representou a queda do regime patriarcal marcado pela frieza e
formalidade e permitiu que a família pudesse usufruir de prazerosas reuniões,
como uma festa de Natal. Assim, é correta a opção [A], pois o fragmento é
ilustrativo de uma concepção das relações humanas marcada pelo distanciamento
de estados de espírito entre duas gerações.
Resposta da questão 2:
[C]
[C]
O autor usa
verbos no pretérito perfeito (“embarquei”, “vim” e “fiquei”) para relatar
tempos passados e concluídos, alternando-os com verbos no pretérito mais-que-perfeito
(“passara”, e “estivera”) para descrever ações que tinham acontecido antes
daqueles primeiros. Assim, o recurso usado pelo autor para organizar a
sequência de eventos é a alternância de tempos do pretérito, como se afirma em
[C].
Resposta da questão 3:
[C]
[C]
Manoel
Bandeira tem como uma das mais fortes marcas a expressão da ternura através de
imagens simples e rotineiras. Apesar de ser uma das marcas da estética
modernista, trazer a vida comum para os versos dessacralizando-o de alguma
maneira, este poeta consegue desenvolver essa transparência através da sutileza
que envolve seu olhar poético tão especial para as pequenas coisas, bem como a
habilidade de descrever em palavras um sentimento tão subjetivo e ao mesmo
tempo tão universal.
Resposta da questão 4: [E]
É correta a opção [E], pois “Macunaíma”, de Mário de Andrade, faz parte da primeira fase modernista, período em que as vanguardas europeias são visíveis nas técnicas inovadoras de linguagem, nas inúmeras referências ao folclore brasileiro e na composição narrativa que se aproxima da oralidade.
Resposta da questão 5: [B]
Neste poema de versos livres e brancos, o eu lírico reflete metalinguisticamente sobre o fazer poético, defende a lírica livre de regras formais, a simplicidade oriunda da espontaneidade e a expressão intensa das emoções, sem resvalar na pieguice sentimental.
Resposta da questão 6: [D]
O poema de Augusto dos Anjos estabelece oposição do conceito de amor relativamente ao de Manuel Bandeira. Enquanto o primeiro valoriza a espiritualidade (“Porque o amor, tal como eu o estou amando,/É Espírito, é éter, é substância fluida”), o segundo enfatiza a importância da carnalidade na relação amorosa (“Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo./Porque os corpos se entendem, mas as almas não”). Assim, é correta a opção [D].
Resposta da questão 7: [E]
Em 1924 foi iniciado o movimento Pau Brasil, por Oswald de Andrade; percebe-se, a partir de então, maior preocupação dos artistas com o próprio Brasil (e a viagem dessa caravana às cidades históricas mineiras é bastante proveitosa nesse sentido) em sua versão primitivista: valoriza-se a arte popular em detrimento à vanguardista.
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